terça-feira, 30 de outubro de 2007

O amor é o que fazemos por ele

Hoje não vou fazer a convencional crónica do Porto-Leixões. Decidi fazer a retrospectiva do meu dia, antes de entrar no estádio, e de todas as implicações que um jogo, a uma Segunda-Feira às 19h45m, traz.

A minha Segunda-Feira começa impreterivelmente às 7 horas da manhã. O tempo voa no momento intermédio em que nos levantamos e começamos irreflectidamente a olhar para o relógio. Há coisas para fazer mas levam demasiado tempo e deixo-as para mais tarde, pois está em causa deslocar-me para a paragem do autocarro. Já são 8 horas da manhã. Apenas fiz o elementar antes de sair de casa. Chego à paragem do bus. Dezenas de pessoas aglomeram-se junto do vidrado, procurando resguardar-se do frio. Chega mais gente. Alguns falam do tempo, outros comentam o fim-de-semana desportivo, outros ainda resmungam pela demora do autocarro. Ninguém se referia ao FC Porto. Mas eu já falava nele interiormente, esperando que as horas passassem tão depressa até à hora do jogo como passou o tempo em que me levantei da cama para cumprir com as minhas obrigações.

Já espero há dez minutos pelo transporte público. Vejo rebuliço entre as pessoas. Vinha ao longe um autocarro. Vislumbrei que os dígitos correspondiam ao que tinha de apanhar. Chegado à paragem, constato que o bus estava cheio. Poucas pessoas saíram e muitas queriam entrar. Pela ordem de chegada, as pessoas dirigem-se para o autocarro. Consegui entrar. Algumas pessoas ficaram à espera de outro com menos lotação. São, mais ou menos, 8h20m e já tive a primeira vitória do dia. Foi complicado, mas foi uma vitória.

A viagem prossegue de forma desconfortável. Há demasiada gente no mesmo espaço. Há senhoras com naturais dificuldades em segurarem-se e lá vamos levantando um ou outro encontrão, uma ou outra calcadela. Há miúdos com mochilas às costas que forçam a passagem para o fundo do autocarro. Há mulheres com crianças ao colo que não sabem para que porta se devem deslocar para saírem com mais facilidade e em segurança. As janelas estão fechadas, o ar condicionado não funciona ou está desligado. Começa a ser difícil respirar. O que vale é que saio já na próxima paragem. Não sei como hei-de furar por entre as pessoas de modo a não magoar ninguém. Peço licença às pessoas junto da porta traseira. Dizem-me que também vão sair. Ok, parece que vai sair muita gente nesta paragem.

Já estou cá fora. Efectivamente, saiu muita gente. Vejo as horas. Ainda tenho tempo. No sítio onde me encontro, há muito mais trânsito na estrada. Os acessos estão muito congestionados. É o normal nesta zona, nesta hora e quando há obras intermináveis que complicam ainda mais o que já de si é complicado. Vem aí o meu bus. Poderia transcrever a papel químico o que se passou nesta paragem e o que já se havia passado na anterior. O tempo, o futebol, a demora, o bus novamente cheio, o posicionamento táctico para se entrar em primeiro, gente aflita com medo de não chegar a horas ao emprego.... e o Porto. Ninguém falava nele, mas eu pensava-o. Desta vez, conseguiram entrar todos. Vitória geral.

A viagem é mais demorada que a anterior. Mais caminho a percorrer, mais carros na rua, mais semáforos, mais estacionamentos abusivos, mais olhares nervosos para o relógio, mais impaciência, como nas pernas trementes daquele homem que está sentado mais à frente. Há gente que suspira, ansiosa que a viagem termine para começarem verdadeiramente o seu dia. Chegamos ao terminal. Já nem quero ver as horas, sei que estou atrasado e quero percorrer de forma lesta os metros que distam do terminal do autocarro ao sítio onde me esperam.

Finalmente cheguei. Há coisas para fazer. Aqui não posso deixar para depois, como em casa. Tarefas para realizar. Pessoas com quem falar. Explicações para ouvir. O tempo agora parece alentejano. Nunca mais passa. Óptimo, já são horas do almoço. O pior ainda aí vem. A tarde será longuíssima. Não terei muito tempo para pensar noutras coisas, que não o cumprimento das minhas funções. Porém, há sempre coisas que me levam a formular raciocínios em que acabo a pensar no Porto. É involuntário. O Porto não me sai da cabeça.

Só peço ao tempo para se despachar porque já não aguento a ansiedade. Acumulo trabalhos. Há um que fica para depois. Este tem de ser feito agora, total prioridade. Tal como eu tenho licença para sair um pouquinho mais cedo do que o habitual. Há quem saiba que o vou fazer para ir ao Dragão, outros não. Também não quero abusar da confiança de quem me autoriza a sair mais cedo e tenho de aguardar o máximo de tempo possível. As 19h são a minha deadline. Esforço-me para me manter concentrado no que estou a fazer. Se ninguém reparar que já estou com a mente no Dragão, então sou um bom actor. A concentração é aparente mas o remoer interior é real. Agora não posso vacilar, isto é importante, tenho de estar atento ao que me dizem. Embrenhado nesta questão esqueço-me das horas. Quando me apercebo do meu lapso são 19 horas e 8 minutos. Culpo-me. Que desleixo o meu, trocar a minha mulher azul por um monte de papéis?!... Desculpo-me e aviso que vou sair. Até amanhã.

O jogo começa às 19h45m e eu ainda estou a uma distância considerável do Dragão. Penso que se tiver a sorte de apanhar o autocarro rápido e se não houver muito trânsito, então ainda vejo as equipas entrando em campo e ouço o nosso hino. Vejo duas pessoas na paragem. Calculo que o autocarro tenha partido sem mim. E agora? Qual será a melhor forma de chegar ao estádio? Aproxima-se um autocarro. Vou neste. Já lá dentro consulto o meu GPS mental e com recurso ao senso comum considero que é melhor abandonar este bus. Concebo um trajecto alternativo. Saí três paragens à frente. Planeio tomar um autocarro que deixar-me-à juntinho à Alameda do Dragão. O meu transporte chegou. Curiosamente levava pouca gente. São 19h20m e estou parado numa longa fila devido aos semáforos. Todavia, a viagem até está a ser rápida e os corredores do bus ajudam a galgar terreno. A aproximação à zona das Antas é terrível. Muitos carros. Gente que saiu do trabalho e desloca-se para casa. Gente que saiu do trabalho e desloca-se para o Dragão. Gente que não sei o que está ali a fazer porque não pode estacionar ali! Já tiravas isso da frente para o autocarro passar, não? Buzine, senhor motorista! Olhe que o semáforo está verde, arranque com isso.... Pronto, já dei sinal para sair. Sh*t, o jogo já começou. Faltam uns míseros metros. Calma, estou quase a chegar. Estes minutos são de aquecimento e estudo mútuo das equipas. Não se há-de passar nada. Ó senhor motorista já abria a porta, não? Os carros andam para a frente e chego à paragem. Saio juntamente com um rapaz que vem das aulas e um senhor que vai para o Dragão. Reconheci isso pelo ar apressado que levava. Ultrapasso-o. Ouço golo quando passo à beira de um café. Golo? Já? De quem? Nem penso em parar para perguntar. Sigo apressado e com a dúvida sobre qual das equipas marcara. Vou a meio da Alameda, passo de corrida, esbaforido..... GOLO! Desta vez sabia que tinha sido o Porto a marcar, o barulho da multidão esclarecia-me. Sorri de contente, mas não sabia se este era o primeiro golo do Porto ou se já seria o segundo. Certo é que o jogo já tinha dois golos e eu ainda me estava a aproximar dos stewards para a revista. Despachei-me rápido, agora corro para os torniquetes, não vá perder mais um golo depois de já estar a vislumbrar pedaços do relvado. Passo os torniquetes, desço as escadas e vejo no ecrã que está 2-0. Felizmente ganhávamos, mas desafortunadamente não tinha visto nenhum dos golos.

O jogo correu bem. Marcámos mais um e jogámos o quanto baste. Faltam dois minutos de desconto para o fim do jogo. Decido sair. Com todas as peripécias para chegar ao estádio, não tive tempo sequer para comer. O meu estômago não vai em futebóis e aguentei o seu aborrecimento até onde pude. Tinha agora de lhe prestar atenção e satisfazê-lo. Perfeito, arranjei boleia de carro até casa. Ainda tenho de caminhar um pouco. Carago, o ar é gélido. Falta pouco. Ali está o carro. Agora é sempre a andar até casa.

22h05m. Hora de chegada a casa. Com a alma saciada de futebol, com o corpo dorido e com um estômago a dar horas, o tempo agora era todo meu. Fisiologia satisfeita, reflicto sobre o meu dia e digiro o jogo do Porto. Bela vitória. Penso no sofrimento que passei para me deslocar ao estádio. O Porto tinha vencido por 3-0 e eu só vira um golo. Raios, chateio-me por isso. Por que escolheram aquela hora? Por que não jogaram no Domingo? Maldita SportTV. Maldita Liga de Clubes. Maldito Hermínio. Maldito Laurentino. Vilipendio os culpados que me ocorrem. Omito a culpa do Porto, que depende das receitas das transmissões televisivas e está inserido no business. Mas quem defende os meus direitos de adepto? Quem se pronuncia sobre a regulamentação de horários e preços dos bilhetes no futebol?

Implementaram-se leis para controlar os adeptos nos estádios. "Não à violência", dizem eles. Quem se importa pela violência física e emocional que sofri ao longo do meu dia para poder satisfazer a minha vontade de estar presente num acontecimento futebolístico? Importam-se os que sentem a mesma indiferença, o mesmo desprezo e desrespeito. Somente aquelas pessoas que não se sentem culpadas por amar e que pensam não serem as únicas a ter de fazer sacrifícios para assistirem ao vivo a um jogo do clube do seu coração. Quem disse que já não há amor?

segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Maracanã vibra com cântico português! E esta, hein?!


Estádio Maracanã. Rio de Janeiro. Brasil. Estas palavras fazem parte do imaginário de todos os adeptos de futebol e muito particularmente dos portugueses, apreciadores ou não deste desporto. Historicamente ligados, Portugal e Brasil mantêm contemporaneamente uma relação estreita no que respeita ao futebol. Por um lado, existem muitos futebolistas brasileiros a actuar em Portugal, o seleccionador nacional é brasileiro e o Brasil desperta interesse em Portugal por ter times com grande história, alguns com origem portuguesa, e também por ter a melhor selecção do Mundo. Vislumbram-se agora sinais de um trajecto inverso. A maior atenção dos brasileiros pelo futebol luso dever-se-à certamente a Felipão, se bem que os clubes portugueses e a selecção nacional gozem hoje de uma visibilidade e prestígio que aguçam a curiosidade do Mundo inteiro. As televisões brasileiras também já passam jogos do campeonato português e existem aqui atletas com possibilidade de serem seleccionados para a canarinha.

Esta nota introdutória serve para, de certa forma, ajudar a explicar uma situação recente que está a agitar o Brasil e que é pouco conhecida em Portugal. Pois bem, surpreendentemente ou não, a torcida do Botafogo, composta por cerca de 2,7 milhões de torcedores, adoptou há cerca de quatro meses um cântico habitualmente entoado no Estádio do Dragão, casa do Futebol Clube do Porto. O cântico em questão é o “Ninguém cala este nosso amor” e funciona para os botafoguenses como um segundo hino do seu clube. Na verdade, este «hit» foi criado pelos Tuff Boys, claque do Futebol Clube do Marco, e tornado célebre pelos ultras do FC Porto. O grande destaque desta notícia é o curioso e até aqui improvável fenómeno de exportação. Portugal sempre se interessou muito mais pelas coisas do Brasil e está mais receptivo a importações do que o contrário. Isto deixa bem claro que esta adaptação pelos brasileiros de um cântico português é um fenómeno novo e que merece ser destacado. Nunca nenhum grupo de música portuguesa, por exemplo, conseguiu atingir o sucesso que lhes permitisse ter visibilidade no Brasil inteiro. No entanto, um cântico de futebol conseguiu-o.



Isto não deixa de constituir um feito assinalável. Do Marco de Canaveses, cidade a uma distância de cerca de 50 km do Porto, onde foi criado, passando pela Invicta onde foi mediatizado, até chegar ao Brasil, este cântico conseguiu uma audiência que nunca os mais conceituados músicos portugueses ousaram atingir em terras de Vera Cruz. Porém, cingindo-nos ao futebol e seus derivados, é um tanto ao quanto estranho constatar que os brasileiros venham beber inspiração a Portugal. O movimento de adeptos organizados em Portugal atravessa uma fase complicada, com a implementação de absurdas leis repressivas, e também nunca fomos um país de referência a este nível. A maior parte dos ritmos que se escutam nos estádios portugueses são adquiridos em Itália ou Inglaterra e é-lhes feita uma adaptação à nossa realidade. Esta é uma prática comum também em Espanha ou na França, países que fazem as suas próprias versões das músicas entoadas nas mecas de Itália ou Inglaterra. Portanto, há músicas de claques na Europa que já têm um cunho universal, não são de um clube em específico, tornaram-se, isso sim, versões especiais de cada clube de um determinado país. Ora, as torcidas brasileiras, e também as hinchadas argentinas, são muito admiradas e respeitadas na Europa. Brasil e Argentina foram modelos a seguir na fase embrionária do movimento de adeptos organizados neste continente. Não é por acaso que a mais antiga claque da Europa, a Torcida Split, fundada em 1950, possui no seu nome a palavra “Torcida”. A influência dos brasileiros sobre os croatas é visível no nome do próprio grupo. Por tudo isto, é ainda mais admirável que uma torcida de um grande clube do Brasil tenha adoptado como seu um cântico originário de Portugal.



Que fique bem claro: não há mal nenhum nas adaptações de cânticos. Os grupos ao fazê-las estão, de certa forma, a mostrar admiração por algo que outros fizeram com qualidade. Achei muito positivo que o “Ninguém cala este nosso amor” tivesse chegado tão longe, ao ponto de influenciar todas as torcidas organizadas brasileiras e de ter obtido um grande impacto nos «media» daquele país. Ao que parece, as torcidas brasileiras, a partir deste cântico, passaram a preocupar-se mais em divulgar o seu amor pelos seus clubes do que em produzir letras ofensivas aos rivais. Neste particular, a torcida do Botafogo foi muito elogiada pela imprensa desportiva brasileira por conseguir com o “Ninguém cala este nosso amor” efectuar uma «revolução» de mentalidades nas arquibancadas brasileiras. Mais, a popularidade deste cântico no Brasil é de tal ordem que foi seleccionado para um anúncio publicitário da TV do Botafogo, com o objectivo de captar mais sócios para o clube.


Os Tuff Boys criaram-no, dando o mote. Ninguém calou os Super Dragões, ninguém calou o Colectivo, e o amor pelo Porto foi entoado com tal força que foi escutado no outro lado do Oceano Atlântico. Agora, é a Fúria Jovem que exprime o seu amor pelo Botafogo, depois de ter ficado impressionada com a devoção da torcida do Porto. “Ninguém cala este nosso amor”..... porque o futebol somos nós, os adeptos, os torcedores, os hinchas, os tifosi....

8ª Jornada da Liga: FC Porto 3-0 Leixões SC

Estádio do Dragão, Porto

36 509 espectadores










FC Porto: Helton, Bosingwa (Cech, 15’), Stepanov, Bruno Alves, Fucile, Bolatti, Raul Meireles, Lucho (Mariano, 71’), Tarik (Hélder Postiga, 60’), Quaresma e Lisandro López.

Treinador: Jesualdo Ferreira

Leixões: Beto, Marco Cadete (Tales, 73’), Nuno Silva, Élvis, Ezequias, Bruno China, Paulo Machado, Pedro Cervantes, Vieirinha (Livramento, 80’), Jorge Gonçalves (Filipe Oliveira, 46’) e Roberto.

Treinador: Carlos Brito

Marcadores: 1-0, Lisandro (6m); 2-0, Tarik (8m); 3-0, Lisandro (79m)

Disciplina: cartão amarelo para Ezequias (26 m) e Fucile (33m)

Melhor em campo: Lisandro

sexta-feira, 26 de outubro de 2007

Uma mentira em forma de resultado

A Côte d’Azur ficou ainda mais deslumbrante com a classe que o FC Porto levou a França. O Bicampeão Nacional teve uma entrada de Dragão no jogo. Só com muita fortuna o Marselha não perdeu. Um grande jogo, com ambas as equipas a lutarem pela vitória, mas com claríssimo ascendente do Porto. Nesta deslocação, o Porto empatou mas poderia ter voltado à Invicta com uma vitória incontestável. Flagrante injustiça e tão difícil de aceitar.

Jesualdo reservou uma surpresa, não só para os marselheses mas também para todos os portistas. Mariano integrou o onze inicial contra todas as expectativas. Tarik tem sido o escolhido e tem dado conta do recado, com maior ou menor fulgor físico. Mariano não foi, neste jogo, o jogador que o Porto precisava. Algo atabalhoado, sem confiança e ritmo, Mariano esteve sempre desenquadrado do resto da equipa. Previsivelmente, acabou por ser substituído ao intervalo.

Na trepidante atmosfera do Vélodrome, o Porto entrou com um vigor assinalável. Sentia-se que respirava confiança e que possuía a responsabilidade e o carácter fundamentais para discutir o resultado nestes grandes jogos. Comandado por Lucho González, o Porto chegava muitas vezes à baliza do Marselha. Raul Meireles, outra unidade do meio-campo, teve em grande foco na primeira parte ao conseguir enviar duas bolas ao mesmo poste! Mandanda ainda tocou ligeiramente na bola em ambos os remates e coadjuvado pelos postes consumou dois verdadeiros milagres para o Marselha. Nos primeiros 45 minutos, o Marselha sentia-se certamente tonto com o carrossel do Porto. O Marselha estava encostado às cordas, dependente da sorte ou da misericórdia do Porto. Foi mesmo por pura sorte que o Marselha não caiu estendido no tapete ainda antes do intervalo.

O apagado Mariano deu o seu lugar a Postiga. O Porto apostava tudo em alcançar o justo golo que lhe foi negado na primeira parte. A superioridade do Porto sobre o Olympique mantinha-se no início da segunda metade e teimosamente também perdurava a inviolabilidade das redes de Mandanda. Lisandro López, Quaresma e Postiga tiveram neste arranque situações flagrantes para marcar, mas por mérito do guarda-redes ou por imperfeição dos remates o marcador não mexia.

O sentimento de injustiça agudizava-se. O Porto dominava a partida em todos os aspectos e jogava melhor do que o Marselha. Mas faltava o golo para validar oficialmente essa “vantagem”, que no fundo não valia de nada. Quando parece que adivinhamos o que vem a seguir no futebol, este troca-nos as voltas e relembra-nos o porquê de ser surpreendente e fascinante. Tudo se encaminhava para que o Porto mais tarde ou mais cedo marcasse, mas quem marcou mesmo foi o adversário. Niang desviou um cruzamento de Cissé e fez balançar as redes de Helton. É certo que o Marselha estava mais interventivo na partida, mesmo este golo sabia a injustiça suprema. Recorde-se que Niang contou com a falta de rigor do árbitro pois merecia ter sido expulso ainda na primeira parte.

O Porto não se deixou abater e continuou a lutar para repor a justiça mínima no marcador. Esta acabou por chegar através de uma grande penalidade. Lisandro foi derrubado dentro da área por Mandanda e Lucho encarregou-se da cobrança certeira do penalty. Atendendo à produção do Porto, este resultado é extremamente enganador. Todavia, para as contas do grupo A, empatar em Marselha foi um bom resultado. Espera-se somente que no Porto-Marselha seja reposta no marcador do Dragão a verdade que faltou no marcador do Vélodrome.

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Champions League Grupo A: Marselha 1-1 FC Porto

Estádio Vélodrome, Marselha

45 000 espectadores










Marselha: Mandanda; Bonnart, Zubar, Faty e Givet (Taiwo, 67’); Cana e Cheyrou; Niang, Valbuena e Zenden (Arrache, 55’); Cissé (Ayew, 88’).

Treinador: Eric Gerets

FC Porto: Helton; Bosingwa, Stepanov, Bruno Alves e Fucile; Paulo Assunção, Lucho González e Raul Meireles (Leandro Lima, 70’); Mariano Gonzalez (Postiga, 46’), Lisandro Lopez e Quaresma.

Treinador: Jesualdo Ferreira

Marcadores: 1-0, Niang (69m); 1-1, Lucho González (78m, g.p.)

Disciplina: Cartão amarelo a Niang (72m), Stepanov (74m) e Mandanda (77m)

Melhor em campo: Mandanda

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Quando a caneta verte o sangue das veias (7)

Visto da margem sul do rio o Porto

visto da margem sul do rio o Porto não explode
sob a tarde de verão, a água reflecte
renques de casario humilde a encastelar-se
irregular em ocres e granito, manchas, vãos, recatos.

é quando os jacarandás se fazem desse azul mais surdo
do anoitecer e concentram uma ameaça do tempo
contida nas cores tensas das fachadas, a entrecortar
os jardins do crepúsculo aprendidos de cor.

além umas arcadas, um cais, o traço grosso a carvão
dos encaixes da ponte armada em ferro, a muralha,
o deslizar da luz para poente, tudo
uma dramática placidez escurecendo a ribeira, um vidrado

de presenças esquecidas, palhetas de ouro fosco, sobre as barcaças
abandonadas, quase ao alcance da mão, da voz, da alma, é quando
a música há-de vir, lentamente elaborada na memória,
como um sopro da infância e do indizível do mundo.

são estes sons do nada, estes voos que perpassam,
estas estrias da sombra de ninguém
sobre o curso do rio, como nuvens para esta hora, a
encrespar-lhe de leve a superfície.

enquanto parte algum comboio atrasado,
um avião se esvai ao longe, os escritórios fecham,
quero um barco pequeno para a minha travessia,
para a minha chegada e para a minha partida,

para andar entre as margens ou seguir a corrente
até s. joão da foz ver as últimas gaivotas
ainda antes da noite, respirar um não sei quê que se desprende
da travessia, a atravessar-me,

halo vindo das camélias, perfume das penumbras
de mulher, ou para sempre e para nunca mais
um pó da lua na cantareira e na afurada
devagar a acender-se mais rente ao coração.

Vasco Graça Moura

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Coração de Dragão: Domingos Paciência

Domingos Paciência foi um dos maiores ídolos dos fans do Porto. Vê-lo jogar era um regalo para a vista. O seu aspecto franzino era tão enganador para os adversários como o manancial de dribles que coleccionava. Num estilo desconcertante, Domingos contornava muralhas defensivas e tirava a paciência que lhe está no nome aos guarda-redes, que não raras vezes tinham de ir ao fundo da baliza buscar a bola. A técnica apurada de Domingos fazia dele um jogador estonteante. Quando progredia com velocidade de movimentos já se prenunciava que Domingos ia, no final, correr para a bandeirola de canto com o braço direito levantado e dedo indicador apontado ao céu, rodopiando a mão, numa forma característica de comemorar os golos.

Foi com a tenra idade de 13 anos que Domingos se tornou jogador do FC Porto, depois de um olheiro do clube da Invicta ter ficado fascinado com o jeito do então avançado da Académica de Leça. Percorrendo os vários escalões de formação, Domingos assinou um contrato profissional em 1987, ano em que o Porto foi pela primeira vez Campeão Europeu. A sua estreia na primeira equipa do Porto deu-se em Abril de 1988 contra O Elvas, pela mão de Tomislav Ivic. Esteve no FC Porto até 1997, altura em que se mudou para o Tenerife. A aventura espanhola durou dois anos e o novo capítulo da sua carreira foi o regresso ao seu FC Porto. Na Invicta, arrecadou 7 títulos de Campeão Nacional, 2 Taças de Portugal e 6 Supertaças Cândido de Oliveira. Foi internacional A português por 34 ocasiões e apontou 9 golos com a camisola das quinas. Em 1995, foi o vencedor de “A Bola de Ouro” que o distinguiu como o melhor futebolista português desse ano. A sua carreira como “número 9” terminaria em 2001 com as cores do Porto. Volvida essa etapa, abraçou as funções de treinador das camadas jovens do FCP, tendo treinado mais tarde a equipa B dos Dragões. Em 2006/07, orientou a União de Leiria. Actualmente, a Académica de Coimbra é a equipa que conta com os préstimos de Domingos na área do comando técnico.

Domingos era um daqueles jogadores que deixava transparecer a alegria que sentia quando pisava a relva. Época após época, a sua habilidade foi sendo aperfeiçoada e o seu poder de finalização foi-se tornando cada vez mais mortífero. O seu sorriso de miúdo traquina era uma das suas imagens de marca. Para ele, driblar vários adversários era o êxtase a que aspirava, secundarizando até a marcação de golos. Talvez devido a essa teimosia de querer fintar sozinho toda a defesa, muitos apelidavam-no de «brinca na areia». Certo dia, Domingos Paciência admitiu que se finalizasse como Papin seria um jogador fabuloso. Para mim, Domingos foi um atleta extraordinário à mesma. Durante a minha vida, poderei ver muitos avançados de grande gabarito, mas estou certo de que Domingos Paciência será o meu brinca na areia preferido de todos os tempos.

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

Se7e

Jesualdo Ferreira e a sua equipa entraram para a história do FC Porto ao conseguirem alcançar sete vitórias consecutivas para a Liga. Este é tão somente o melhor registo da era Pinto da Costa. Batido que está o anterior recorde de Artur Jorge com seis triunfos seguidos, a meta é a de Siska, que por treze vezes consecutivas saiu do terreno de jogo com o sabor da vitória, na época 1939/40.

Coimbra não é a casa do FC Porto, mas quase. Há 37 anos que o Porto não perde na cidade banhada pelo Mondego. Vira-se mais uma folha no calendário e mais uma vez os estudantes não conseguiram infligir uma derrota ao Bicampeão Nacional. A liderança consolida-se em boas bases e com uma vantagem segura.

No gramado, Quaresma e Tarik testaram as capacidades de Pedro Roma, que novamente mostrou estar particularmente inspirado nos jogos contra o Porto. Todavia, aos 21 minutos, Tarik teve tudo para fazer golo, mas a pontaria não foi a mais certeira. O único golo da partida aconteceu de grande penalidade a castigar uma falta sobre Quaresma. Chamado a converter, Lucho González não deu hipóteses de defesa a Pedro Roma, que ficou pregado no relvado. E o meio-campo foi todo de Lucho González.

Alcançada a vantagem, o Porto geriu o resultado, que acaba por se justificar. No entanto, a equipa orientada por Domingos Paciência deu uma boa réplica ao Porto. Para a história deste jogo fica mais um resultado positivo em Coimbra e a sétima vitória consecutiva da equipa da Invicta. Saboreie-se agora este delicioso e memorável se7e!

7ª Jornada da Liga: Académica 0-1 FC Porto

Estádio Cidade de Coimbra

8 262 espectadores









Académica
: Pedro Roma; Orlando, Litos, Kaká e Pedro Costa; Pavlovic (Tiero, 73'), N’Doye e Ivanildo (Hélder Barbosa, 31'); Miguel Pedro (Vouho, 85'), Joeano e Lito.

Treinador: Domingos Paciência

FC Porto: Helton; Bosingwa (Cech, 33'), Stepanov, Bruno Alves e Fucile; Paulo Assunção, Lucho González e Raul Meireles; Tarik (Leandro Lima, 54'), Lisandro Lopez e Quaresma (Adriano, 77').

Treinador: Jesualdo Ferreira

Marcadores: 0-1, Lucho González (28m)

Disciplina: amarelo a Stepanov (35m)

Melhor em campo: Lucho González

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Coração

Em Istambul, o Porto passou incólume pelo inferno do Inönü, estádio do Besiktas. O apoio dos fanáticos adeptos locais não foi suficiente para derrotar os bravos da Invicta. O Porto não abalou com a ebulição que se fazia sentir, soube lidar com a pressão e teve a felicidade de alcançar uma importante vitória que o coloca numa boa posição no grupo A da Champions League.

Foi ao ritmo dos cânticos turcos que o jogo começou. Impulsionados pelo público, os jogadores do Besiktas entraram na partida decididos a ganhar no seu território. Por sua vez, o Porto tentava suster a avalanche turca e partir organizadamente para o ataque. Fruto da determinação do Besiktas, o Porto sentiu bastantes dificuldades para sair com a bola controlada na fase inicial do jogo. As linhas médias do Porto viam-se obrigadas a recuar e colocavam-se muito próximas da defesa portista. O ritmo vigoroso empreendido pelos turcos forçava a que o Porto sofresse para manter a baliza inviolável. Helton esteve intransponível se bem que, em algumas situações, a falta de pontaria dos turcos ajudou a manter as redes impenetráveis.

O Porto conseguiu chegar poucas vezes à baliza do Besiktas, no primeiro período do jogo. Quaresma, Tarik e Raul Meireles foram os mais inconformados no ataque às redes do clube turco. Lisandro López esteve um pouco mais apagado do que o habitual. Do lado do adversário, o perigo vinha sobretudo de Delgado. Com muito coração, o Besiktas empolgado pelo som que ecoava das bancadas lutava com todas as energias para obter um golo. Com muito coração, o Porto resistia e anulava como podia as investidas dos homens de Istambul.

O marcador ao intervalo estava a zeros. O Porto tinha aguentado 45 minutos de puro suplício. Desde o início da partida que o Besiktas garantia uma superioridade numérica a meio-campo. Isso forçava a que os médios recuassem muito e ficassem impossibilitados de apoiar o ataque. Assim se explica também o pouco aproveitamento ofensivo da primeira parte. Com a entrada de Marek Cech, o jogo altera-se. O Porto passa a dispor de maior posse de bola, anula a vantagem numérica do meio-campo do Besiktas e faz com que Lucho e Meireles subam mais no terreno de modo a darem maior dinâmica ao sector ofensivo. É já em 4x4x2 que o Porto começa a deter o controlo do jogo. Com Adriano também em campo, o Bicampeão Nacional cria algumas boas situações para se adiantar no marcador. Jogando com uma outra dinâmica, o Porto conseguiu suplantar o domínio turco e mantém a bola mais afastada de Helton. Quando se pensava que o jogo terminaria como começou, Ricardo Quaresma marcou o golo que deu a vitória e que veio premiar todo o esforço colectivo dos azuis e brancos.

Resumindo, o Besiktas mesmo contando com o espectacular apoio dos seus adeptos não conseguiu materializar em golos a sua qualidade. Os jogadores turcos tiveram uma tremenda entrega ao jogo, nunca desistindo de nenhum lance. O Porto teve a sorte do jogo. Soube sofrer quando tinha de sofrer, teve atitude e teve um óptimo rendimento na segunda parte. Depois de hora e meia no inferno, o golo nos instantes finais foi uma delícia com que os deuses recompensaram os bravos e invictos jogadores do FC Porto.

Champions League Grupo A: Besiktas 0-1 FC Porto

Estádio Inönü, Istambul










Besiktas: Hakan Arikan; Serdar Kurtulus (Ali Tandogan, 71’), Gokhan Zan, Ibrahim Toraman e Ibrahim Uzulmez; Edouard Cissé, Serdar Ozkan e Tello; Delgado; Ibrahim Akin (Higuain, 67’) e Bobo (Márcio Nobre, 26’).

Treinador: Ertugrul Saglam

FC Porto: Helton; Bosingwa, Stepanov, Bruno Alves e Fucile; Paulo Assunção, Lucho González e Raul Meireles (Leandro Lima, 87’); Sektioui (Cech, 65’), Lisandro Lopez (Adriano, 75’) e Quaresma.

Treinador: Jesualdo Ferreira

Marcadores: 0-1, Quaresma (90m)

Disciplina: amarelo a Lucho González (45m), Bruno Alves (66m) e Ali Tandogan (87m).

Melhor em campo: Helton

segunda-feira, 1 de outubro de 2007

Até Sempre, Mãos de Ferro

Frederico Barrigana morreu no passado Sábado, vítima de problemas pulmonares. O antigo guarda-redes do FC Porto, natural de Alcochete, partiu aos 85 anos. Barrigana chegou ao FC Porto depois de ter representado o Unidos do Montijo e o Sporting. Tinha 21 anos quando chegou e só abandonou o Porto passados 14 anos. Internacional A português por 12 vezes, o Mãos de Ferro nunca teve a felicidade de ser campeão pelo FC Porto, já que o clube atravessava a pior fase da sua história. Todavia, o seu valor como atleta era extraordinário. Barrigana é o segundo guarda-redes mais utilizado de sempre pelo Porto, só sendo destronado por Vítor Baía. Por dedicação ao clube, Barrigana, a dado momento da sua carreira, rejeitou ingressar no Vasco da Gama, onde iria auferir um ordenado 10 vezes superior! Depois do Porto, representou o Salgueiros, onde viria a terminar a sua carreira como atleta e a iniciar-se como treinador. Chaves e Académico de Viseu foram os clubes que também orientou na sua curta aventura de treinador. Pinto da Costa teceu um emocionado comentário sobre Barrigana, dizendo que "perde-se uma glória da sua geração, mas nunca se perderá a memória de um guarda-redes fabuloso e de uma excelente pessoa." Até sempre, Frederico Barrigana.